A TARTARUGA DE KRISHNA

No verso 58, do segundo capítulo do Bhagavad Gita, Krishna fala a seu discípulo Arjuna sobre a importância do Prathyahara, usando como metáfora a tartaruga, um animal que é capaz de se retrair para dentro do próprio casco, eliminando assim o contato com o mundo exterior.
Para alguém mais desavisado, pode parecer que Krishna está sugerindo a seu discípulo que ele não deve agir. Na verdade, o ensinamento é para que ele aprenda a dominar os sentidos, não se deixe levar por eles. Estar no mundo, sem ser do mundo. Continuar agindo, sem se apegar aos frutos da ação.
Prathyahara, o 5o passo da Yoga segundo Patanjali, é o controle dos sentidos, importante para não sermos seduzidos pelo “canto de sereia” de Maya, o mundo dos prazeres e da ilusão. É um conhecimento necessário para quem pretende encontrar a felicidade – que é a própria essência da natureza humana – e realizar o Samadhi, a única experiência verdadeira.
Mais adiante, no capítulo 3 do Gita, Krishna fala sobre Karma Yoga, a Yoga da Ação. Agir ou não agir, a dúvida que atormenta Arjuna, atravessa os tempos e continua nos dias de hoje. Acontece que não existe a opção de não agir, mesmo que você resolva “estar uma árvore”, como diria Manoel de Barros. Onde há vida, existe movimento. Arjuna aprende que o importante é fazer as coisas com amor. Parece simples e é mesmo, desde que você consiga se livrar dessa carga pesada chamada Ego. Essa sim, uma tarefa difícil.
Certa vez escrevi que “nós, os bilhões de seres humanos que giramos pelo espaço a bordo deste planeta simpático, temos feito muita besteira, mas também temos produzido obras extraordinárias como a Muralha da China, o iPhone, a 9a Sinfonia e a Giselle Bündchen”. Se estivéssemos recolhidos dentro do casco, é provável que a roda ainda não tivesse sido inventada.
Gosto dos que não se omitem, dos que ousam correr riscos. A idéia de se enfiar dentro do próprio casco apenas para se proteger do mundo exterior me incomoda. Me interessa o recolhimento como momento de reflexão, para poder entrar em ação com sabedoria.
Vejo muita gente levando uma vida de ameba, cheia de medos e cuidados para não comprometer o sonho de uma vida eterna. Preocupados em reprimir pecados, não produzem nada de útil e interessante. A questão não se resume a não fazer o que é errado. É preciso ter a coragem de dar o passo seguinte. Yama e Niyama.
“Pedra que rola, não cria limo”.

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