E tudo...

João Schmidt, meu produtor, é um dos meus melhores amigos, apesar de não me convidar para as festas que promove. Ele diz que atrapalho, só porque não bebo, não fumo e não gosto de ar condicionado. Reclamo que isso é preconceito contra as minorias, mas ele tá nem aí.

Schmidt nasceu em Pelotas, quer dizer, o corpo nasceu em Pelotas. A alma nasceu em Salvador, Bahia, e anos depois as duas partes se encontraram no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro.

João é um ótimo companheiro de viagem, sempre bem humorado e profissional de primeira linha, atento a todos os detalhes. Só sai da linha depois que termina o dia de trabalho. Aí ele brinca dizendo que vai onde quer, faz o que quer e não tem que me dar satisfação. Está certo ele.

Outro dia estávamos em João Pessoa. Após o show saímos pra jantar e voltamos pro hotel já de madrugada. Cheguei ao meu quarto e fui até a varanda olhar o mar, que estava lindo, iluminado por uma lua cheia. Foi quando vi, sorrateiro, na ponta dos pés, o safado escapando rumo à balada noturna paraibana. Que, dizem, é da pesada. Mandei um “Psiu! Tô de olho em você”. Me respondeu com um sorriso, dizendo: “Não... só vou ali comprar cigarro e já volto”.

Foi visto entrando no hotel às 6h da manhã, todo sujo de areia. Provavelmente passou a noite rolando na praia. Tudo bem, eu não tenho que me meter na vida dele, mas não deu pra resistir: naquela viagem ganhou o apelido de Croquete.

Uma das manias simpáticas que ele tem é sempre terminar uma conversa com a expressão “e tudo...”. Assim mesmo, com as reticências, provocando nossa imaginação. Acredito que queira dizer algo como “e tudo mais que possa acontecer”, “e tudo aquilo que a vida oferece”, “e tudo de bom que ainda vai rolar”. É uma expressão que dá margem a várias interpretações, inclusive negativas. “E tudo de ruim que vamos ter que segurar”, “e tudo que significa aguentar aquele mala”. Seria uma forma reduzida de dizer “e todas as inerências do processo”. Sim, todo processo é um pacote. E pode ser uma caixinha de surpresas, nunca se sabe.

Por isso, gosto dessa expressão do Schmidt. Ela deixa o assunto em aberto. Uma conversa nunca se esgota pra quem tem o espírito livre. Nada é definitivo. Amanhã posso acordar pensando o contrário do que falei hoje. Como dizia meu tio Aparício, o Barão de Itararé, “triste não é mudar de ideia, triste é não ter ideias pra mudar”. E tudo...

4 comentários:

  1. Kledir, me chamo Diego, sou amigo do Nando (pianista) de Joaçaba SC, e resido em Catanduvas, cidade próxima a Joaçaba, interior do meio oeste de SC. Admiro vocês pela transparência, cumplicidade e personalidade, são inspirações para nós, jovens que estamos iniciando dia a dia na Música. Bom, já acessei seu site e seu blog, gosto da maneira que compõem e interpretam. Aproveito para lhe fazer um convite: conhecer o site de minha dupla www.diegoegabriel.com.br e meu blog www.osabbath.blogspot.com E como o seu produtor nos sugere, "E tudo..."

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  2. É isso ai, Kledir, João schimitd, merece essa homenagem, ele é 10, "e tudo..."

    abraços e beijos ao dois

    Walkiria

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  3. k, eu adoro esse joão.

    e me delicio com as estorias que cê conta... lendo sua crônica, eu me lembrei dele, no rio, a gente ali naquele banquinho de não-praça, em frente onde o vitor fez um show com o suzano, ennquanto eu pitava o quinto parliament apesar dos seus protestos.

    quase que eu te deixei ir pra sua casa sem mim e fui conhecer, de verdade, a noite do rio de janeiro.

    sim, porque todo cara que fuma, bebe e não é vegetariano, tem tudo pra ser uma excelente companhia.

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  4. Eu tento não ser uma eco-chata, but.. Fumei por mais de 40 anos, fui no psiquiatra pois não aguentava mais ver minha filha chorar, temendo que morresse de câncer. Fiz tudo que ele mandou e tomei lá o tal de Zitron/Albutrim (anti-depressivo tarja preta que tem como efeito colateral aversão ao cheiro de cigarro), funcionou muito bem e passei até pela fase de síndrome do pânico sempre que alguém fumava perto de mim. Aprendi uns exercícios respiratórios e fiquei bem, porém dependente de balinhas sem açúcar e azedinhas. Felizmente hoje sinto maior liberdade. Não suporto cheiro de bebida destilada ou de gosto amargo como cerveja, melado como licor e também meu corpo é pouco tolerante ao álcool. Gosto de ventilador de teto. Estou como aquele chato descrito por Tom Jobim: Eu nunca sonhei com você, nunca fui ao cinema
    Não gosto de samba, não vou a Ipanema
    Não gosto de chuva, não gosto de sol
    E quando eu lhe telefonei, desliguei, foi engano, o seu nome eu não sei
    Esqueci no piano as bobagens de amor que eu iria dizer, não
    Lígia, Lígia
    Eu nunca quis tê-la ao meu lado num fim de semana
    Um chopp gelado em Copacabana, andar pela praia até o Leblon
    E quando eu me apaixonei, não passou de ilusão, seu nome rasguei
    Fiz um samba canção das mentiras de amor que aprendi com você, é
    Lígia, Lígia
    Eu nunca quis tê-la ao meu lado num fim de semana
    Um chopp gelado em Copacabana, andar pela praia até o Leblon
    E quando você me envolver nos seus braços serenos eu vou me render
    Mas seus olhos morenos me metem mais medo que um raio de sol
    Lígia, Lígia

    Bom pelo menos adoro o verbo Tom Jobim que tanto me consola.
    Beijos e abraços pro teu amigo do coração.

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