No início de sua carreira, Sócrates foi convidado a participar de um programa de televisão. O apresentador começou a entrevista perguntando de onde ele era e, ao responder que era de Belém, ouviu estarrecido: “Mas você é da capital, Natal, ou é do Interior?”.
Não estou falando do filósofo, que nunca deu entrevista para a TV, estou falando do Dr. Sócrates, um dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos. Nos dois sentidos, já que tinha 1 metro e 91 de altura.
Certa vez estávamos no Bar do Val em Ribeirão Preto e Magrão, como era chamado pelos amigos, contava histórias como essa da televisão. Em determinado momento citou Confúcio. Aí, com perdão pelo trocadilho, eu fiquei confuso. A cena era inusitada: o único Sócrates que leu Platão, citando Confúcio. E, pra complicar ainda mais, um Sócrates que era irmão de Sóstenes, Sófocles e... Raí (que quase foi batizado de Xenofonte). Falávamos de futebol e já não lembro mais como fomos parar em filosofia. Magrão era uma figura única, bom papo e bom amigo.
Ele mesmo debochava de seu prestígio, relembrando comentários: “Como é que pode um cara que chuta pra trás fazer tanto sucesso no futebol?”.
Calcanhar iluminado, Sócrates faz parte daquele grupo seleto que deu grandeza ao futebol e elevou o esporte bretão à categoria de arte. Foi líder da Democracia Corintiana, um revolucionário conceito de gestão de clube de futebol através do voto, que escancarou em plena ditadura militar o sentimento que tomava conta de todos os segmentos do país.
Uma outra vez, em Curitiba, participei de um evento sobre futebol, onde fiz o papel de mediador de uma conversa com o Sócrates. Mais do que conduzir um bate-papo com o ídolo para uma platéia lotada, minha emoção maior foi entrar em campo no jogo festivo que se seguiu.
Não joguei nada, prejudicado pelo frio paranaense e pelos adversários que insistiam em roubar a bola dos meus pés. Não importa, foi uma noite inesquecível, joguei com o Sócrates. Um dia vou poder contar para os meus netos. No final, trocamos camisas, com direito a autógrafo, para provar que não estou mentindo.
Magrão, com seu jeito bem humorado, comentou que foi um jogo ecológico, parecia uma floresta: eu plantado lá na frente, ele lá atrás. Um coqueiro e uma sequóia. Eu só me mexia quando batia o vento. Demos ao time o apelido de Floresta Futebol Clube e, é claro, perdemos. Tudo bem, não era campeonato. O problema é que agora, com a saída do Magrão, o time ficou desfalcado. E não tem ninguém no banco que possa substituir.
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Kledir, amigos deixam grandes saudades não é mesmo?
ResponderExcluirE esse, com certeza deixou, para você, como amigo, para nós como grande ídolo no futebol.
Bjão
Rita
Bacana seu texto. Bonita homenagem.
ResponderExcluirO talento é algo que não se substitui.
ResponderExcluirBeijoSu