Quando vi o caldeirão fumegando e me dei conta que
estávamos sendo preparados para virar sopa de índio, pensei: “isso só pode ser
um pesadelo”. Não era. Fiz sinal pro meu companheiro que, com a cabeça
embaralhada pelos efeitos do cachimbo de bambu, não havia percebido a gravidade
da situação. Parti para uma ideia de risco. Me desvencilhei dos braços das
nativas floridas, passei a mão no ukelelê e gritei: “diz aí ô do pandeiro”.
O grito de carnaval acordou meu parceiro do delírio
alucinógeno em que estava metido. Atacou um solo de pandeiro que, justiça seja
feita, merecia nota 10 em todos os quesitos. Diante de uma platéia estarrecida,
caiu de joelhos e fez o instrumento rodopiar na ponta do dedo indicador como se
fosse um pião. Na sequência, sob aplausos entusiasmados, nosso malabarista fez
o pandeiro rolar sobre seu braço direito, passar por trás da cabeça e ir parar
na mão esquerda. Foi quando ataquei um Ré maior em ritmo de samba e puxei: “ô
lelê, ô lalá, pega no ganzê, pega no ganzá”. A indiada enlouquecida pelo ritmo
alucinante do samba brasileiro, tentava requebrar as cadeiras, imitando nosso
show-man que, a essas alturas, gingava mais que rainha de bateria. Eu, iniciado
apenas na Dança do Pezinho, emburaquei num frenesi descontrolado, com passos
desconcertantes que, sinceramente, não sei de onde saíram.
O mais inacreditável é que foram ficando todos
contagiados por aquele fuzuê carnavalesco. Bem, é possível que o tal cachimbo
de bambu tenha contribuído um pouco. Quando notei que o próprio chefe bonachão
já estava em transe, com os olhinhos revirados e um abacaxi na cabeça, tentando
imitar Carmem Miranda, fiz sinal pro meu parceiro e saímos em desabalada
carreira, em direção à praia. Corremos feito loucos, com aquela horda de
canibais tentando alcançar nossos calcanhares. Confesso que não sei se queriam
continuar dançando ou se queriam jantar mesmo. Na dúvida, enfiei o ukelelê na
cabeça de dois ou três nativos e empurramos a lancha pra dentro do mar. Aí,
tudo começou a girar. Como eu não tinha fumado nada, imaginei que havíamos
entrado na espiral ascendente, de volta à realidade.
Meu depoimento para o Fantástico se limitou a
desmentir meu parceiro: “o sujeito bebe”. Claro, não vou me expor ao ridículo
de afirmar coisas que não tenho como comprovar. Além disso, vai que a Globo
Internacional passa lá na ilha e o chefe me enxerga na TV falando mal deles. Periga
aqueles malucos saírem pelo redemoinho e virem até aqui me buscar. Eu hein?!?
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